Oi, gente! Tudo bem com vocês?! O Prosa-Curiosa foi marcado pela querida Luana  (Psicose Literária) para responder à TAG Liebster Award.
A TAG consiste em escrever 11 fatos sobre mim; responder 11 perguntas criadas pelo blog que fez a indicação; indicar de 11 a 20 blogs para também  responder a Tag;  fazer 11 perguntas para os blogs indicados; inserir o selo Liebster Award no post e linkar o blog que fez  a indicação da TAG.

11 fatos sobre mim: 

1. Minha alma mudou seu lar no dia 15/08/2006;
2. Adoro o céu (nascer e pôr do sol, nuvens, chuva, tudo que vem ou está relacionado, ando sempre olhando pra cima);
3. Sou a bagunça em forma de gente;
4. Sou desastrada e muito indecisa;
5. Fico muito nervosa e falo muito rápido quando tenho que falar em público (mas o nervosismo é só no primeiro momento, depois que meu coração vai desacelerando, começo a falar e não paro mais);
6. Toco teclado, arranho violão e gosto de cantar (musica é vida pra mim);
7. Sou extremamente perfeccionista;
8. Amo fotografia;
9. Sou formada em Administração;
10. Sou muita agradecida a Deus por tudo em minha vida (tudo que tenho e sou devo a Ele).;
11. Sou apaixonada pela natureza (natureza no geral, verde, flores,  animais).

Perguntas feitas pela Luana, do Psicose Literária: 

1. Quantos livros você tem? 


Em média uns quinhentos e pouco. Confesso que sou um ciúme só com eles. Não gosto de emprestar. Nem de marcá-los. Tenho tanto cuidado que até quando vou lê-los abro bem pouco para não prejudicar o miolo. E tenho a mania de ficar cheirando-os. 

2. Alguém te incentivou a ler?  Quem? 

Sim. Além do exemplo da minha mãe e irmã mais velha, tive muito incentivo na escola onde estudei quando criança. Lá eles faziam concurso de leitura e feira literária. Para a feira, os livros eram criados pelo próprios alunos. E haviam as premiações: medalhas para primeiro, segundo e terceiro lugar em serie individual; troféus para primeiro, segundo e terceiro lugar em níveis gerais (primário, fundamental, médio). Teve um ano que eles publicaram o livro dos primeiros lugares dos níveis gerais.
P.S. Na terceira série em ganhei as premiações: primeiro lugar na sala e segundo lugar no geral. =) 

3. Qual o pior livro que já leu ou que menos te cativou? 

Recentemente li um livro que foi descoberta literária para mim chamado Love Story - Uma historia de amor. Não sei se vocês o conhecem, mas o filme derivado dele é considerado um clássico romance. Minha mãe romântica ama muito esse filme. Descobri o livro e resolvi lê-lo, mas infelizmente não me cativou muito. Apesar de amar a frase marcante que vem dele "Amar é nunca ter que pedir perdão". Por incrível que pareça o filme me pareceu melhor que o livro. 

4. De que maneira você acha que a leitura muda a vida das pessoas? 

Conhecimento é poder, já diz a famosa expressão. Acredito que livros e educação mudam vidas, e são nossa aposta para um mundo melhor porque por meio da leitura a gente pode se conhecer melhor. A leitura nos abre um horizonte de possibilidades. Ela é como uma luz em meio a escuridão. Quantas pessoas que poderiam ir para o mundo do crime, mas mesmo em meio ao caos adquiriram o amor pela leitura, e isso deu a elas a força necessária para escolherem um bom caminho na vida. Poderia citar aqui infinitos exemplos. Escolhi falar sobre o cineasta Critiano Burlan. Nascido em lar desestruturado, vida difícil, mas por meio de muita influência de um amigo de infância, aliás o único que sobreviveu (todos os outros foram para vida do crime e morreram logo), adquiriu o amor pela leitura e isso mudou sua vida. 
O cineasta contou em uma entrevista para professor emérito da ECA-USP, Jean-Claude Bernardet, que tinha poucos livros em casa, a maioria gibi, pois sua mãe era viciada em lê-los no banheiro. E esses foram os mesmo que ele mais lia a princípio, mas logo depois seu amigo começou a lhe emprestar outros livros. Primeiro livros bobos e depois os grandes clássicos da literatura. Ele conta que a leitura o afavaga um pouco no meio de tanta violência, tristeza e solidão, e que ela foi como uma abrigo, uma maneira de sair daquele lugar. Também o que ajudou na escolha de sua profissão. "Lia o tempo todo, em casa, no ônibus – desenvolvi uma técnica para ler em pé, esmagado no ônibus, não sei como não descolei a retina! Porque na época em que morava no Capão Redondo (periferia paulista), o transporte era pior do que hoje – demorava duas, três horas para ir de casa ao Centro, para o trabalho".
Hoje Cristiano é diretor de cinema e teatro. Tendo em sua filmografia mais de 15 filmes, entre ficções e documentários. É professor  (e ex-aluno) da Academia Internacional de Cinema – AIC. A maior parte de sua filmografia participou de importantes Festivais, como o Festival de Havana, de Málaga, Toronto, Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, Festival do Rio entre outros. Citei sua experiência de vida para responder a pergunta proposta porque exemplos falam mais do que palavrasEssa é uma das maneiras lindas de mudança na vida de uma pessoa ocasionada pela amor à leitura. Lembrando que o primeiro post aqui do Amor em Prosa & Cia. foi relacionado ao mesmo tópico da pergunta. Fica aqui caso queiram conferir Como livros mudam vidas? =)

5. Quantos livros você já leu? 

Pergunta bem complicada de responder. Eu leio desde pequenininha, não cheguei a contar quantos livros li. Posso dizer apenas que foram vários. 

6. Qual o livro que mais te influenciou ou chegou ao ponto de  mudar sua vida? 

Difícil a missão de escolher um livro preferido, ou apenas um que tenha me influenciado, já que foram vários que me inspiraram e transformaram minha maneira de pensar. Se fosse para citar um no quesito “literatura”, seria "A insustentável leveza do ser", de Milan Kundera. Foi uma das leituras desse ano que me fez repensar em diversas situações. 

7. Qual o gênero que mais te agrada? 

Romance Filosófico.

8. Quais os 3 melhores livros que você já leu?

Essa pergunta não se faz. Meu coração é grande demais e dentro dele cabe mais de 3 melhores livros lidos. Haha. Pra não ser a chata direi 3 livros que estão na minha lista de melhores leituras desse ano. "Na Natureza Selvagem", de Jon Krakauer; "O Oceano no Fim do Caminho", de Neil Gaiman; "A insustentável leveza do ser", de Milan Kundera. 

9. Já "tomou" antipatia de algum personagem? Qual? 

Realmente não lembro. Antes que me critiquem, sou a Dory em forma de gente. Esqueço de tudo! Haha. A verdade é que como o personagem me causou antipatia, foi logo esquecido. :p 

10. Prefere livro físico ou digital?

Mil vezes o livro físico, mas confesso que leio mais rápido livro digital.

11. Qual sua citação preferida?

São tantas! Deixarei 5 aqui:

"Estar perto não é físico." (Ismael Canappele)

"Felicidade só real quando compartilhada." (Cristopher McCandless)

"Oh, como se deseja às vezes escapar da estupidez sem sentido da eloquência humana, de todas aquelas fases sublimes, para se refugiar na natureza tão inarticulada, ou na ausência de palavras da labuta longa e pesada, do sono saudável, da verdadeira música, ou de uma compreensão humana tornada muda pela emoção." (Boris Pasternak)

"O amor também se aprende." (Gabriel García Márquez)

"Precisamos de livros que nos afetem como um desastre, que nos entristeçam profundamente, como a morte a quem tenhamos amado mais que a nós mesmos, como ser banido pra florestas isolas de todos, como um suicídio. Um livro deve ser um machado para o mar enregelado que temos dentro de nós." (Franz Kafka) 

Minhas perguntas para os indicados: 

1. Quantos livros você tem? 
2. Alguém te incentivou a ler ? Quem?
3. Indique um livro e diga o por quê da indicação.
4. Você acredita que livros mudam vidas? Por quê?
5. Quantos livros você tem? 
6. Você já teve uma leitura certa em um momento necessário? Se a resposta for sim, fale sobre.
7. Qual o gênero que mais te agrada?
8. Prefere livro físico ou digital?
9. Além da leitura, o que mais ama fazer?
10. Você tem vontade de escrever um livro um dia? Se sim, qual seria o gênero?



Edição: 1ª/4ª REIMPRESSÃO | Editora: COMPANHIA DAS LETRAS | ISBN:85-359-0013-6 | Ano: 2000 | Páginas: 266
Sinopse: Onze anos depois da publicação de Relato de um certo Oriente, Milton Hatoum retoma os temas do drama familiar e da casa que se desfaz. Dois irmãos é a história de como se constroem as relações de identidade e diferença numa família em crise. O enredo desta vez tem como centro a história de dois irmãos gêmeos - Yaqub e Omar - e suas relações com a mãe, o pai, a irmã e a empregada.
O lugar da família se estende ao espaço de Manaus, o porto à margem do rio Negro: a cidade e o rio, metáforas das ruínas e da passagem do tempo, acompanham o andamento do drama familiar.
 

Nota: 5/5 
Conheci à escrita de Milton Hatoum por indicação de um amigo que sempre recomendava a leitura das obras dele. De tanto ouvi-lo falar tão bem dos livros que outrora ele havia lido do escritor, que não resisti e tive que comprar para conhecer. Pesquisando sobre o autor, descobri que o mesmo era da minha cidade. E que orgulho, gente! Esse autor tem uma escrita incrível! Dizer que o autor escreve bem é pouco! Eu sei que “Dois Irmãos” é o primeiro livro dele que leio, mas gozar o gosto de suas palavras me causou a ânsia precisa de quero mais. E pra mim isso é um fator determinante de qualidade.

Quando acabei de ler seu belíssimo romance “Dois Irmãos”, publicado pela Editora Companhia das Letras, encontre-me em júbilo com a qualidade da obra. Esse é o tipo de livro que nos invadem de uma forma diferente, nos mostra e diz muita coisa. Desde as primeiras páginas do enredo fiquei enlaçada com a história, querendo saber mais e mais sobre. O poder da escrita do Milton é indescritível! É rica em detalhes, mas não enfadonha. Surpreendentemente envolvente o autor nos faz mergulhar no prazer de uma excelente narrativa. 

Você se lembra da história de Pedro e Paulo do romance de Machado de Assis? Não?! Então tente se lembra da história bíblica de Esaú e Jacó. Lembrou? Essa com certeza você deve lembrar. Esaú e Jacó, irmãos gêmeos que iniciaram sua história de animosidade entre si desde o ventre de sua mãe, perdurando depois do nascimento. O romance “Dois Irmãos” segue essa mesma linha de tema, um conflito entre dois irmãos gêmeos, de personalidades totalmente opostas. Omar e Yaqub, filhos de imigrantes libaneses que vivem em Manaus. Quando tinham por volta de 13 anos se desentenderam, o que sucedeu num ferimento causado por Omar, que deixou marcas enraizadas no corpo e na alma de Yaqub. Depois desse acontecido, Yaqub foi enviado para o Líbano e regressou após 5 (cinco) anos. Quando retornou veio ressentido, injustiçado e se sentindo um estrangeiro. Esse ressentimento mudou totalmente sua relação com seu o irmão e sua mãe.

Toda narrativa do livro se passa na cidade de Manaus na primeira metade do século XX, beirando o começo da opressão nos anos 60, no qual o progresso militar passa a apoderar Manaus. Aliás, a capital do Amazonas no romance é uma forte personagem. O escritor consegue apresentar Manaus com uma graciosidade e requinte singular, que foge à idealização na qual, qualquer pessoa de fora da cidade possa pensar sobre. Manaus é retratada quase sempre mais adiante das suas superfícies; nas suas fissuras, povoados, travessas, praças, rios... Descrita na vida dos seus moradores e nas transformações que todo progresso desordenado acarreta às amplas cidades. O autor nos apresentar este cenário no livro casado com o percurso de imigrantes árabes. Sendo exata o enredo trará um drama familiar de um desses imigrantes.

Na narrativa conhecemos Galib, imigrante árabe, trabalha com sua filha Zana em seu restaurante no centro da cidade de Manaus. Halim (outro imigrante) que sempre almoça nesse restaurante, se encanta por Zana. Logo depois Zana se casa com Halim, e da família que os dois irão formar nasce os gêmeos Yaqub e Omar, personagens centrais do romance. Em seguida também nasce Rânia, a filha mais nova do casal. No decorrer da narrativa além desses personagens também conhecemos Domingas, empregada da família que possui etnia indígena, e o narrador, este que permito ao leitor descobrir por si mesmo na elaboração temporal que cada página promoverá.
 

A narração da história é algo interessante. Ocorre que passamos determinado tempo da leitura sem ter noção de quem está narrando tudo. É aos poucos que vamos descobrindo a identidade do relator. Existe uma indagação por trás disso tudo que nos mantém na expectativa até o termino da obra. Outro ponto que prende e chama atenção no livro é o fato do texto ser totalmente descrito de forma diacrônica e não sequencial. Em outras palavras, o texto não segue uma linha exata conseguinte de tempo. 

Milton conseguiu produzir um enredo em que “o narrar uma história” é cercado por detalhes poéticos. A trama elabora substancialmente a contenda fraternal, porém, a mesma está enrolada por várias abstrações. O autor percorre um caminho na sua história em que os desígnios se mostram sem que exista uma precisão de dissipá-los. Os relatos não fluem na narrativa de maneira que devam-se apontar soluções. Ficam lacunas abertas, porém não existe insuficiência. Permanecem expectativas e não certezas.

Dois Irmãos” é um romance tocante e comovente, que remete a algo muito frequente, que pode estar existente na vida de qualquer pessoa: o conflito familiar. A narrativa do livro mostra como uma rivalidade fraternal pode arremeter toda uma família. O livro é um misto de emoções. O autor escreve de maneira tão aprazível, as personalidades de seus personagens são tão naturais e agradáveis. Os cenários que pinta são tão encantadores e a narrativa que disserta te enlaça da maneira que você quer chegar ao final logo e ao mesmo tempo não quer. Existem vários temas abordados no transcorrer da história, alguns são tão tênues que você precisa repensar para saber se é mesmo aquilo. Milton Hatoum brinca com as gradações, mas ao mesmo tempo trata tudo com a sisudez que demanda.

Enfim, esse livro é daqueles que marcam. Existe uma partição de sentidos, se por um lado sua descrição é intensamente consolidada de atenção, por outro sente-se uma ânsia de fechar o livro para refletir e conseguir apanhar toda a afeição que está sendo transmitida. Romance mais do que recomendado! Um livro excelente, de punho nacional, surpreendentemente rico e bem construído. Leia! Vale muito a leitura!
  
Recentemente foi lançado pela  Quadrinhos na Cia., linha de quadrinhos da Companhia das Letras a adaptação para HQ do romance Dois Irmãos. O álbum foi produzido em conjunto pelos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá após o premiado Daytripper – vencedor do Eisner Award, Havey Award e Eagle Award – e chegou nas livrarias brasileiras em março deste ano. Certamente, uma leitura indispensável para todos os fãs de boa literatura e quadrinhos. 
Lembrando que o HQ "Dois Irmãos" também já está programado para ser publicado nos Estados Unidos, pela editora Dark Horse. Batizada com o título Two Brothers, o lançamento acontecerá no  mês de outubro de 2015.

P.S. O romance também vai virar minissérie na TV Globo. O ator Cauã Raymond fará o papel dos irmãos, espero de verdade que saia coisa boa, estilo “Capitu” (amei essa minissérie, achei bem feita). O bom é que o autor está auxiliando nas gravações, então talvez realmente venha coisa boa por aí! Bem, gente! Com todas essas novidades não dá pra ficar sem ler essa história incrível! O essencial é que antes da estreia da minissérie todos leiam o livro para ficarem ambientado com os acontecimentos. Então, corre lá na livraria! Recomendo muito a leitura! Entrou na minha lista de melhores livros lidos esse ano!   

Quotes do livro: 

"No mercado Municipal, escolhia uma pescada, um Tucunaré ou um Matrinxã, recheava-o com farafa e azeitonas, assava-o no forno de lenha e servia-o com molho de gergelim". Pag. 47

“Naquela época, tentei, em vão, escrever outras linhas. Mas as palavras parecem esperar a morte e o esquecimento. Permanecem soterradas, petrificadas, em estado latente, para depois, em lenta combustão, acenderem em nós o desejo de contar passagens que o tempo dissipou. E o tempo, que nos faz esquecer, também é cúmplice delas. Só o tempo transforma nossos sentimentos em palavras mais verdadeiras”. Pág. 244

"Alguns dos nossos desejos só se cumprem no outro, os pesadelos pertencem a nós mesmo". Pag. 264 

Sobre o autor
Descendente de libaneses, ensinou literatura na Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e na Universidade da Califórnia em Berkeley. Escreveu Cinco obras: Relato de um Certo Oriente, Dois Irmãos, Cinzas do Norte (esse último vencedor do Prêmio Portugal Telecom de Literatura e todos os três primeiros ganhadores do Prêmio Jabuti de melhor romance), Órfãos do Eldorado e A Cidade Ilhada. Seus livros já venderam mais de 200 mil exemplares no Brasil e foram traduzidos em oito países, incluindo Itália, Estados Unidos, França e Espanha. “Dois Irmãos” foi publicado em 2000, é o segundo livro do autor. Apesar de todos serem muito bem premiados, mas o que realmente se destaca por ter premiações internacionais é “Cinzas do Norte”.
Hatoum é conhecido por misturar experiência e lembranças pessoais com o contexto sócio-cultural da Amazônia e do Oriente. 

"Porto de lenha, tu nunca serás Liverpool!"





Título:Capitães da Areia
Autor: Jorge Amado
Editora: Companhia das Letras
Edição: 3ª / 16ª Reimpressão
Páginas: 294
ISBN: 978-85-359-1169-5
Nota: 5/5
Uma das dimensões do valor de uma obra é o quanto ela consegue manter-se atual mesmo com o passar dos anos. "Capitães da Areia" é uma dessas grandes obras que sobrevivem ao tempo. Carrega em suas linhas um tema ainda atual e polêmico.

O livro foi escrito pelo autor brasileiro Jorge Amado e publicado em 1937. O romance retrata a vida do grupo de menores abandonados, chamados de "Capitães da Areia", ambientado na cidade de Salvador do ano de 1930. Tendo como cenários as ruas e as areias das praias de Salvador, o livro retrata a vida de crianças sem família que viviam em um velho armazém abandonado (trapiche) no cais do porto da capital baiana. Os motivos que as uniram eram os mais variados, entre eles: ficaram órfãs, foram abandonadas, ou fugiram dos abusos e maus tratos recebidos em casa.

O livro é dividido em três partes: “Sob a Lua, Num Velho Trapiche Abandonado” (apresenta o local em que as ações transcorrerão); “Noite da Grande Paz, da Grande Paz dos Teus Olhos” (parte que surge a menina Dora); Canção da Bahia, Canção da Liberdade (mostra a desintegração dos líderes). Antes dessas divisões, existe uma sequência de reportagens e depoimentos, explicando que o grupo Capitães da Areia é composto de menores abandonados, marginalizados, que aterrorizam Salvador.

Entre os personagens que compõem o núcleo central da narrativa estão Pedro Bala, Professor, Sem-Pernas, Volta-Seca, Gato, Boa-Vida e Pirulito. Cada um possui uma história de vida mais triste que a outra. Suas idades variam entre 11 a 14 anos. O mais velho (Pedro Bala) tem 16 anos.

O livro é bem escrito, rico em detalhes e nos faz sentir um misto de sentimentos em relação ao que denominamos hoje “meninos em situação de risco”. No decorrer da narrativa o autor nos mostra os dois lados da moeda em relação ao menor delinquente. Isso nos provoca uma mistura de sensações. Ao mesmo tempo em que a gente se enfurece por um estupro realizado, nos compadecemos ao ver o arrependimento do ato. Dessa forma Jorge Amado vai conduzindo a narrativa e mostrando outras diversas situações que envolvem os garotos, fazendo com que o olhar do leitor sobre a problemática seja executado sobre diversos ângulos. 

Em boa medida de um conjunto, resumiria "Capitães da Areia" como meninos que estão na disputa de um motim. Atacam as pessoas (estupram, enganam, assaltam), tudo isso para subsistirem. Que fiquei claro que não estou justificando e nem dizendo que sou a favor das infrações no livro relatadas. Apenas estou discorrendo que não posso julgar uma mãe por ter uma vida miserável e não ter noção da sua miserabilidade. Não posso julgá-la por colocar uma criança no mundo sem pensar, se o meio que ela vive à direciona dessa forma. Também não posso julgar essa mesma criança (fruto dessa mãe) nos seus atos ao passo que ela está fazendo o que é passivo de todo ser humano: sobrevivendo.

Eu sei que é complicado pensar em tudo isso - atos de violência que nos acomete no dia-dia - sem julgar e ter raiva, ainda mais quando passamos pela situação. O famoso jargão “só sabe, quem passa”. Quem já passou (exemplo, eu) sente na pele gritar o lado emotivo da coisa (raiva, ódio, vingança). Mas ficar histérica acredite, não mudou e nem nunca mudará em nada os ocorridos de violência que nos pegam. Onde eu quero chegar com tudo isso, é falar que no decorrer da leitura do livro “Capitães da Areia”, o autor me fez pensar sobre esse sentimento de asco que me invade ao ler uma notícia de crime que envolva um menor (seja abandonado ou não), seja quem for, mas no caso aqui: menor mesmo.

Vou contar para vocês um fato pessoal. Eu já fui assaltada três (3) vezes. Na primeira vez fui abordada por dois adolescentes munidos com arma de fogo. Os dois apontaram a arma para o meu filho que na época tinha apenas três (3) anos de idade. Eles levaram tudo que eu tinha em mãos (bem material). Imagine que a rua estava cheia de gente, mas isso não os impediu de realizarem o assalto. Claro, ninguém iria se meter. Eles estavam munidos. Na hora do assalto fiquei sem reação (como todo mundo). Mas assim que eles viraram a rua, peguei meu filho e desci para minha casa. Estava tremendo e com muita raiva. Confesso a vocês que eu queria matar aqueles meninos. Queria pegar o carro e ir atrás deles. Minha vontade era passar com carro por cima (momento de furor), mas não o fiz. Então tentei me acalmar e ficou aquele sentimento de raiva. Desde desse acontecido à famosa popular expressão “bandido bom é bandido morto” me acometeu.

Bem, eu citei o fato acima porque ao ler o livro "Capitães da Areia", por incrível que pareça não consegui sentir raiva dos meninos pelos atos cometidos na história. Talvez vocês possam pensar: "Claro Radija! Não aconteceu nada parecido com você na vida real. Aí é fácil, né?!" Mas a verdade é que o problema principal não é o caso de não ter acontecido comigo as mesmas situações listadas no livro. Porque de fato eu leio nos jornais sobre diversas situações horríveis que acontecem aqui e mundo à fora. E acredite, ao lê-las tenho sentimento de repulsa e reprovação. Mas no livro o que me fez não ter esse mesmo olhar sob os atos, foi simplesmente a forma que o autor discorreu as condutas por todos os ângulos.

No decorrer do romance ele me fez ter empatia pelos personagens. Eu consegui ver o menor como: infrator, abandonado, sobrevivente, ser humano... Fiquei pensando sobre a expressão popular citada acima no fato que ocorreu comigo. Expressão que já se manifestou no meu pensamento e em diversos pensamentos (bocas) aqui e no Brasil à fora. Junto com pensamento veio às questões sobre esse buraco enorme que existe na nossa sociedade. Os descasos das organizações que “cuidam” do menor. Eu comecei a ver a questão sobre outro ponto de vista, ou melhor, sobre vários pontos. E que descaso e agravante. 

“O problema dos menores abandonados e delinquentes que quase não preocupava a ninguém em toda cidade.” Capitães da Areia, Pag. 74

Pense comigo sobre a denúncia que esse romance (publicado em 1937) traz. A temática de fundo: a criança abandonada na Bahia, no Brasil, na América Latina... Vamos calcular, estamos falando de uma coisa que tem mais de 70 anos. Sendo mais exata, faz 78 anos que esse livro foi publicado. Agora veja na atualidade a questão ainda forte, o agravante e o descaso. Um atual complexo fenômeno dos meninos e meninas de rua, problemática antiga, delatada no livro. O que no sentido Boaventura de Souza Santos na década de 70, também foi exposto do ponto de vista Sociológico, apontando para a cidade do Rio de Janeiro. 


Diante da temática atual que o livro traz em suas linhas, surge à indagação: o que mudou de lá pra cá em relação à problemática que na década de 30 (época da publicação do livro) já era agravante? O que melhorou? Imagine que junto com essas perguntas vem às reflexões também do fracasso das instituições que cuidam de crianças e adolescentes. Não importa o nome que se dê a isso: orfanato, FEBEM, seja o nome que for. O que quero dizer é que mudar o nome das coisas nunca resolveu e nem nunca resolverá o problema. Porque o que vemos hoje em dia é apenas a mudança de nome nas instituições, mas os descasos dentro dela permanecem. Descaso que também é delatado no livro.

“Era um pequeno quarto, por baixo da escada, onde não se podia estar em pé, porque não havia comprimento. Ou ficava sentado, ou deitado com as pernas voltadas para o corpo numa posição mais que incômoda. Aprendeu a não beber caldo de feijão, que aumenta a sede. O barril onde defeca exalam um cheiro horrível. Não o retiram ainda. E sua barriga dói, sofre horrores para defecar. E como se as tripas fossem sair. As pernas não o ajudam. O que o mantém em pé é o ódio que enche seu coração.” Capitães da Areia, Pag.209

Interessante também é compreender a simbologia do “trapiche” (lugar onde os meninos viviam). Crianças abandonadas que não tem casa, não tem um lar (esse lugar privilegiado pelo afeto dos pais), veem no trapiche o lugar constitutivo e atributivo. Tentando simplificar, uma criança abandonada na rua está em um não lugar (a rua), aonde ela não é ninguém, ao passo que o trapiche atribui a essa criança uma identidade. Exemplos mostrados no livro: Pedro Bala, o chefe; Pirulito que depois vira Sacerdote; o Professor que é o que faz as leituras à noite a luz das velas, depois se torna um artista. Todo ser humano busca uma identidade no mundo. Todo ser humano é dotado de uma identidade. Eu passo a ser alguém a partir do momento que possuo a minha identidade. Aquilo pelo qual as pessoas irão me conhecem. Ao passo que, aquela criança abandonada que na rua (um não lugar), não é ninguém, passa naquele lugar privilegiado que no caso da história é o “trapiche”, a ser constituído como alguém. Vejamos que é no “trapiche” que os capitães podem começar a tentar buscar não exatamente sua identidade como, sujeito, mas sua identidade social.

Podemos ver no livro que Pedro Bala, por exemplo, além de um idealista, é um idealista da liberdade. O Pirulito, além de ser um menino obsessivo, é um menino chamado por Deus, vocacionado. Então se constrói essa identidade naquele local. O que não é diferente do que ocorre hoje em dia. Crianças buscam em seu meio social sua identidade, seja com o traficante ao lado, onde quer que seja. Se não tem lei e instrução, devido não ter pais para estipular ordens e direcionar, então fundamentam suas leis no lugar aonde buscam sua identidade. Voltando novamente para o "trapiche", para o chefe do lugar, Pedro Bala, é dali que vai emanar a lei. É naquele local que a criança vai autoquestionar-se. "O que eu quero ser quando eu crescer? Quem é o meu espelho? Quem eu sou? De onde eu vim? Para onde eu vou?"

É aí, que entra o problema. A criança pode até não ter as respostas naquele momento, mas há o espelho no meio onde ela se encontra. Onde pode começar a formular quem ela quer ser: “Eu não sei nada de onde eu vim, mas quero ser igual aquele traficante que me faz de aviãozinho. Igual o dono da Boca que vive cheio da grana. O mesmo que me dá um trocado para eu não morrer de fome. Ou igual aquele rapaz que bate carteira. Igual aquele chefe aqui do trapiche (Pedro Bala)”.

Seguindo a linha de raciocínio o quero dizer é que é intuitivo do sujeito buscar sua identidade. É intuitivo de uma criança se espelhar em alguém. Nós seres humanos nos reconhecemos no outro. Eu sei um pouco de quem sou de onde vim e para onde vou, a partir do outro. Então se eu cometo um delito porque eu sou fruto do meio social de onde nasci e vivi isso não me faz necessariamente um delinquente. Uma criança pode cometer um delito e não ser um infrator. Pode ter contato com a droga e não ser um tóxico dependente. Existe uma diferença abissal entre uma coisa e outra. E o autor com seu livro queria resgatar isso. Há uma diferença entre ser delinquente e ser uma reação circunstancial a um estado, a uma condição de vida.

Sobre o problema pode haver uma melhoria desde que não haja descaso, como ocorre até hoje. É preciso que se crie organizações qualificadas realmente dedicadas na causa. Porque não há como negar que nosso país ainda apresenta uma grande quantidade de pessoas em condições de miséria. Eu bato na tecla de que a educação é a chave. Parafraseando Mandela para falar no geral: Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ninguém nasce odiando um policial, ninguém nasce aprendendo a roubar, ninguém nasce aprendendo a matar. Para odiar, matar, roubar, seja o que for, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender tudo de ruim que a vida pode ensinar, elas podem também serem ensinadas de forma a serem pessoas melhores. Falo especifico dos menores, pois eles ainda estão em processo de formação e podem sim, mesmo que não seja 100% todos, melhorar.

Entrando agora no caso da maior idade penal que tem dado o que falar ultimamente. E tendo em vista que este livro se relaciona com a temática “menor abandonado”, que em sua maioria se relaciona com o crime, manifestarei minha mera opinião sobre ao assunto. Lembrando que é apenas opinião de leitora.

O que mais se viu nesses últimos dias foi o bafafá sobre a redução da maior idade penal. Sobre como isso “reduziria a violência nessa faixa etária, porque grandes partes da violência realizada no país são praticadas por adolescentes, que praticam os atos sem medo, porque sabem que não descerão a penitenciaria”. Quem nunca ouviu isso? Eu escuto e leio direto nos comentários pelas redes sociais. Pensando sobre isso discorro que isso é o maior mito que li na vida. Capitães de Areia que nos comprove que a violência é problemática antiga, já agravante na época da sua publicação. Está mais do que comprovado que a penalidade pura e simples, bem como a massa de pena antevista ou obrigatória, mesmo para o adulto, não é um coeficiente de queda da violência. Modelo exato é aquele dado pela chamada "Lei dos Crimes Hediondos" (Lei nº 8.072/90), que por meio de um trato mais severo com os autores de tais violações, objetivava baixar sua incidência. Sucede que, nunca foram realizados numerosos crimes hediondos como hoje, sobressaltando nossas cadeias e penitenciárias lotadas a tal ponto de se estar estudando a revogação ou alteração dessa lei, de modo a assentir o encadeamento para um regime prisional menos severo tal qual previsto para os crimes comuns (Informações segundo pesquisa de opiniões de especialistas da área). Nos Estados Unidos, onde existe a previsão de penas de morte e prisão perpétua, em 07 (sete) anos de aumento de sentenças aplicadas a jovens, o que se verificou foi a TRIPLICAÇÃO dos crimes praticados entre adolescentes, sendo comuns casos de "chacinas" produzidas por jovens em escolas. O que é importante para a redução da violência é a AÇÃO RÁPIDA e EFICAZ das autoridades encarregadas da segurança pública e da própria Justiça, de modo que os crimes praticados sejam rapidamente esclarecidos e seus autores - adolescentes ou não, recebam a devida sanção. A sistemática prevista pelo Estatuto da Criança e do Adolescente visa justamente isso, de modo que, por exemplo, um adolescente possa ser sentenciado a uma medida de prestação de serviços à comunidade ou obrigação de reparar o dano NO DIA SEGUINTE à prática infracional, desde logo iniciando o cumprimento da medida. Se isso não ocorre na prática, a culpa não é da lei, mas sim da falta de uma estrutura adequada para sua implantação. A proposta do Estatuto é tão boa e avançada que, no Brasil, foi COPIADA pela chamada "Lei dos Juizados Especiais Criminais" (Lei nº 9.099/95), destinada a crimes de menor potencial ofensivo praticado por adultos, bem como vem sendo estudada e tendo sua sistemática também adotada por vários outros países, em especial da América Latina. Veja que novamente podemos ver aqui a delação que Jorge Amado fez sobre a falta de estrutura das Instituições que cuidavam dos menores e que até hoje existe. A melhoria que poderia ter acontecido em relação a problemática se houvesse estrutura nas Instituições.

Finalizo essa resenha enorme dizendo a você leitor do blog que esse livro é excelente! Ele entrou na lista de melhores leituras recentes que fiz. Fico pensando porque o mesmo não é obrigatório nas escolas. O que você pode extrair desse livro não cabe em um papel. É discussão para vários dias. Tente ler a sociedade com Capitães da Areias nas mãos. Veja a verdadeira saga urbana que Jorge Amado criou. Fantástico e emocionante! Atual e necessário! Maravilhoso, muito bem escrito e detalhado. Eu não narrei muito do livro em si aqui, digo a história, porque isso você tem que conferir com seus próprios olhos. Ter suas próprias reflexões e empatia. Além de todo os questionamentos que o livro me trouxe, também me causou um misto de sensações indescritível. Só sentindo! Leiam! Recomendo muito! Se já leram contem nos comentários como foi sua experiência com a leitura. Irei adorar saber. Até a próxima resenha!